Com o objetivo de compartilhar com o PT o desgaste político do projeto de lei que regulamenta a terceirização no país, legendas governistas têm pressionado o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), a colocar as medidas provisórias do ajuste fiscal, que restringem direitos trabalhistas e previdenciários, em votação antes do texto dos terceirizados.

A campanha organizada pelo PT e pela Central Única dos Trabalhadores (CUT) contra o projeto da terceirização, que inclui distribuição de panfletos com a fotografia dos deputados que votaram a favor do texto-base da proposta, gerou irritação no Congresso Nacional, inclusive entre parlamentares que integram a base aliada. Os petistas e os sindicalistas da CUT alegam que a mudança nas regras de contratos terceirizados tornará mais “precária” a relação de trabalho no país, mas os apoiadores do texto argumentam que a alteração dará agilidade às empresas.

O texto principal do projeto da terceirização foi aprovado pelos deputados no dia 8. No entanto, ficou pendente a análise das sugestões de alteração no texto original. A previsão é que a Câmara retome nesta quarta-feira (22) a apreciação dos destaques para concluir a votação.

Líderes de siglas aliadas ao Palácio do Planalto ameaçam usar mecanismos previstos no regimento interno da Câmara para atrasar a análise das pendências do projeto da terceirização. Defensor do projeto da terceirização, o líder do PSD, deputado Rogério Rosso (DF), propõe que, antes de a Câmara concluir a votação do texto, é preciso deixar clara para a sociedade a posição do PT sobre direitos trabalhistas, colocando em votação as duas MPs publicadas em dezembro pela presidente Dilma Rousseff.

Segundo ele, a bancada do PSD se reunirá na manhã desta quarta para decidir se obstrui a votação do texto da terceirização.

“Fui surpreendido com material da CUT que dizia que quem tinha votado o texto-base votava contra os direitos do trabalhador. Até o jornalzinho do PT diz que o texto tira direitos. Como não conseguimos encontrar nenhum artigo da lei que retire direitos, nossa ideia é votar antes a MP 665. Essa, sim, altera regras de seguro-desemprego, pensão e outros. Quero saber o que pensam a CUT e o PT sobre isso, para aí enfrentarmos a questão da terceirização”, destacou o líder governista ao G1.

Embora defenda as mudanças nas regras para os terceirizados, o líder do PROS na Câmara, Domingos Neto (CE), também advertiu que sua legenda irá atuar para adiar a votação do texto. O partido governista quer que as MPs dos ajustes fiscais sejam apreciadas antes.

Neto contou que parlamentares que defendem a mudança nas regras de terceirização estão sendo “pressionados” em suas bases eleitorais, recebendo panfletos que os acusam de violar direitos dos trabalhadores.

“O PT atacou a todos, inclusive a minha bancada, nas nossas bases, nos nossos estados. Estão utilizando o projeto de terceirização para fazer uma campanha ostensiva, atacando deputados que votaram a favor. Foi uma forma de jogar cortina de fumaça no ajuste fiscal”, acusou o líder do PROS.

"Não podemos aceitar patrocínio do PT contra a terceirização sem ter clareza se os direitos do trabalhador colocados em cheque na medida provisória terão o mesmo apoio do PT”, acrescentou.

Já o deputado Júlio Delgado (PSB-MG) diz defender a inversão da pauta para ter a oportunidade de mostrar como pensam os parlamentares do PT em relação aos trabalhadores. “Meus amigos estão mostrando o que foi divulgado nas ruas de Juiz de Fora [MG] sobre o projeto da terceirização. Estão mostrando fotos dos deputados que concordam com o texto. Quero ver votar a medida provisória para mostrar como cada um pensa em relação ao trabalhador”, ironizou.

Apesar dos apelos, o presidente da Câmara assegurou ao G1 que não irá inverter a pauta para votar antes as medidas provisórias que restringem acesso ao seguro-desemprego, pensão por morte e auxílio-doença.

"Não existe essa possibilidade. A terceirização, vamos votar amanhã [quarta]. Não tem como passar antes as MPs do ajuste fiscal porque não tem nenhuma que saiu da comissão. Vamos votar a terceirização amanhã", enfatizou.

O relator do projeto da terceirização, deputado Arthur Maia (SD-BA), também defende que a análise do projeto seja concluída nesta semana. “Tenho certeza de que teremos uma votação. A única emenda que temos de derrubar é a emenda que não permite terceirização de atividades-fim. Temos, pelo menos, 120 votos a mais para garantir a terceirização de qualquer atividade”, disse Maia.

Ele critica a campanha liderada pelo PT contra os parlamentares que votaram a favor da proposta. “A campanha que o PT fez foi muito virulenta contra os partidos da base aliada, o que deixou esses partidos muito irritados. Em Brasília, colocaram um panfleto com o retrato de sete deputados dizendo que: ‘Esses ladrões roubaram dinheiro do povo’”, queixou-se o deputado oposicionista.

PT minimiza estratégia
Vice-líder do PT na Câmara, o deputado Alessandro Molon (RJ) disse que a estratégia de votar as MPs dos ajustes antes do projeto da terceirização não reduzirá o desgaste político dos deputados que votaram a favor da regulamentação da atividade terceirizada. Na visão do parlamentar petista, o “dano” provocado pelo projeto é "muito maior" que as restrições previdenciárias impostas pela medida provisória editada pelo Executivo.

“Quem votar a favor dessa proposta [terceirização] jamais será esquecido. Essa votação será lembrada em décadas, porque é o maior retrocesso desde a criação da CLT. Nenhuma outra votação vai eclipsar isso. Quem apoiar isso não vai ser esquecido”, disse Molon.

Uma emenda de autoria de Molon prevê a retirada do trecho do projeto que estende as subcontratações para qualquer atividade das empresas, um dos pontos mais criticados do texto. Atualmente, uma súmula do Tribunal Superior Eleitoral (TST) limita a terceirização para as chamadas atividades-meio e impede esse tipo de contrato para atividades-fim das empresas. Ou seja, uma universidade particular pode contratar de outra empresa serviços de limpeza e segurança, mas não operar com professores terceirizados.

De acordo com Molon, se os deputados aprovarem sua emenda que retira a ampliação das terceirizações para as atividades-fim, o projeto trará menos "prejuízos" aos trabalhadores.

"Muitos parlamentares, diante das reações da sociedade, se deram conta da gravidade do projeto e se arrependerem de ter votado o texto-base. Acho que vários partidos vão orientar pela retirada da atividade-fim, porque perceberam a gravidade do erro. Dos 45 milhões de trabalhadores com carteira assinada no Brasil hoje, 33 milhões são empregados diretos e 12 terceirizados. Se for aprovado o texto como está, vai haver a inversão desses números”, destacou o petista.

Racha no PSDB
A discussão sobre o projeto da terceirização também provocou rachas no PSDB, principal partido de oposição ao governo federal. Segundo o G1 apurou, parte dos deputados tucanos se sentiu pressionada pela campanha negativa criada em torno da proposta e ficou preocupada em perder votos com a eventual aprovação do texto.

O líder do partido na Câmara, deputado Carlos Sampaio (SP), chegou a defender na última quarta (14) mais tempo para “refletir” sobre o trecho do projeto que permite a terceirização de qualquer atividade. Um dia depois, entretanto, o presidente nacional do PSDB, senador Aécio Neves (MG), saiu em defesa do projeto e disse que os deputados do partido foram “influenciados” em suas bases eleitorais para adiarem a votação.

“A minha posição pessoal era pela manutenção do entendimento anterior [de votar o projeto do relator]. As limitações para o setor público são prudentes, mas o consenso que existia anteriormente deve ser buscado. Houve uma tentativa de influenciar alguns dos nossos deputados nas suas bases, talvez até de forma artificial”, disse Aécio.

Conforme o deputado Nilton Leitão (PSDB-MT), a legenda oposicionista se dividiu em torno do ponto que amplia a terceirização para todas as atividades. “Deputados se sentiram atingidos pelas informações divulgadas pelo PT e houve uma divisão com relação à atividade-fim. Acredito que o partido vai estar bem mais unido nesta quarta.”

Pressão
Sindicalistas da CUT pretendem reeditar nesta quarta-feira os protestos contra o projeto da terceirização promovidos nas últimas duas semanas. Para pressionar os deputados, a central sindical convocou seus filiados a voltarem a ocupar aeroportos durante o embarque dos parlamentares para Brasília. No aeroporto internacional Juscelino Kubitschek, na capital federal, um grupo de sindicalistas recepcionará os congressistas, a partir das 6h, para pressioná-los a votar contra o texto.

De acordo com a CUT, os parlamentares serão "alertados" que quem votar a favor da proposta terá seu nome e suas imagem divulgada "nos bairros onde moram, perto das escolas onde estudam seus filhos, na frente do local de trabalho de suas esposas e em frente à casa de seus pais como inimigos da classe trabalhadora".

Na última sexta-feira (18), o diretório nacional do PT aprovou resolução que pede para parlamentares petistas e sindicalistas reforçarem a campanha contra o projeto da terceirização.

“O Diretório Nacional considera fundamental a ampliação da mobilização sindical
e popular contra a terceirização, nas ruas e nas redes, até que a pressão seja suficiente
para estabelecer nova relação de forças nas duas casas legislativas”, diz trecho do documento petista.

A resolução do PT também “conclama” a presidente Dilma Rousseff a defender pessoalmente mudanças na proposta.

Fonte: G1, 22 de abril de 2015.