Inspirado em empresas de tecnologia como Google e Facebook, que nasceram em imóveis residenciais, um empresário do Distrito Federal resolveu trocar o escritório comercial que ocupava havia 15 anos por uma casa de alto padrão de 2 mil m² no Lago Sul, bairro nobre da capital. Na nova sede da desenvolvedora de aplicativos mobile, os funcionários podem usufruir da piscina, tomar bicicletas emprestadas e até espairecer na "área de descompressão": um espaço com churrasqueira, mesas de sinuca, pôquer, tênis de mesa, sofás e um freezer repleto de cervejas.

Dono da empresa, Breno Martins acredita que oferecer regalias é uma forma de melhorar a qualidade de vida dos funcionários e, consequentemente, a produtividade deles. "A gente se inspirou nas sedes das grandes empresas do Vale do Silício [na Califórnia, nos Estados Unidos], como Facebook e Google. Todas elas tiveram como primeira sede uma casa com piscina, e esse tipo de ambiente que favorece a colaboração", diz.

O empresário afirma pagar R$ 20 mil mensais pelo aluguel do imóvel, que antes funcionava como sede de uma embaixada. O valor não é muito diferente do que desembolsava pelo escritório de 120 metros quadrados na área central de Brasília – em torno de R$ 18 mil. Com a mudança para uma área residencial, os funcionários também deixaram de depender do estacionamento do Setor Comercial Sul, já que podem estacionar em uma área própria nos fundos da casa.

"Já passamos uma temporada em um edifício comercial que tinha uma cara mais ortodoxa de empresa, um monte de 'baiazinhas'. Mas decidimos, pelo tipo de pessoas que trabalham conosco, migrar para esse formato mais aconchegante, despojado, que realmente combina com o perfil da galera que tem aqui, da geração Y, geração Z. O pessoal dá muito valor para esse tipo de interação", diz.

A empresa oferece outros benefícios aos funcionários: disponibiliza uma funcionária para preparar café da manhã e lanche da tarde, paga mensalidade da academia e oferece ajuda de custo para a aquisição de notebooks. Os empregados também não batem ponto. "A gente prega que a empresa é alinhada ao resultado. Não tem ponto, ninguém controla horário, mas a gente controla o compromisso com os objetivos que a empresa tem, e isso a gente observa que é levado na prática", diz.

Para a gerente de projetos Daniela Molina, o resultado mais importante que o ambiente de trabalho proporciona é o estreitamento das relações. “Pessoas que jogam sinuca ou videogame juntas se tornam amigas, parceiras. Isso é refletido nos projetos, na sinergia da equipe”, diz.

A empresa, que existe desde 2000, já desenvolveu aplicativos para o Sistema de Seleção Unificada (Sisu), Fundo de Financiamento Estudantil, Programa Universidade para Todos (ProUni) e tem contratos com os ministérios da Saúde, do Turismo e da Integração Nacional.

“Fica também muito difícil ter inimizades. Às vezes, no ambiente de trabalho, a gente fica com má impressão sobre as pessoas, fica com pouca informação. Mas com o momento de descompressão, você tem mais facilidade de criar simpatia pelas pessoas, tem mais chance de brincar uma com a outra de se misturar, falar um pouco mais sobre a vida um do outro. Isso é muito legal”, diz.

Enquanto jogam sinuca, passeiam de bicicleta ou bebem cerveja durante o happy-hour, os funcionários interagem e criam um ambiente favoravel à busca de soluções, diz Martins. "Ficou mais fácil a colaboração entre eles em função dessas coisas. A gente queria que o pessoal tivesse mais esse momento de interação. Muitas vezes, trabalhando atrás do computador, não dá tempo de conversar e conhecer de fato quem está ao lado.”

Embora seja um trabalho técnico, Martins diz que desenvolver aplicativos para tablets e celulares requer muita criatividade dos funcionários. "O mobile não é algo trivial de ser feito. Transformar um portal do MEC [Ministério da Educação] em aplicativo, para o estudante baixar no telefone, é um desafio maior ainda. Então precisamos criar oportunidades para o pessoal trocar ideias e realmente alavancar esse lado criativo. Faz toda a diferença", diz Martins.

"Às vezes o cara está estressado, quer dar uma volta, pensar direito, até para implementar uma solução que é preciso para um aplicativo. Algumas pessoas pegam a bicicleta e vão fazer 'SUP' [stand up paddle] no Pontão."

Para lidar com tanta liberdade, o empresário diz que sentou com os funcionários e que eles propuseram regras para o uso da "sala de descompressão" e das bebidas alcoólicas. "Durante o almoço e depois das 18h todos têm autonomia para usar a sinuca, pingue-pongue, totó. A parte da bebida a gente estabeleceu que seria na sexta-feira. Partiu deles o acordo, em vez de ser uma restrição da direção da empresa. Eles acharam que assim seria mais fácil gerenciar esse tipo de coisa", diz. "Imagina trabalhar com um colega ao lado que acabou de tomar duas cervejas e precisa falar sobre um assunto delicado?"

A interação, para ele, favorece a harmonia e o ganho de resultados. "A gente percebe que facilita muito e cria um ambiente em que todo mundo é amigo, não existe competição interna. O que existe aqui de fato é um time. Tem o pessoal que joga no gol, tem o pessoal que é artilheiro. Mas o pessoal sabe que só dá certo se todo mundo tiver o mesmo objetivo."

Daniela diz que um salário maior não é suficiente para um funcionário trocar de empresa. “O mercado paga bem os funcionários de TI sênior. O que fideliza eles à empresa é o lugar, porque eles sabem que não vão encontrar aquilo em outro lugar. Às vezes vai encontrar um lugar que paga mais, mas ele não vai, porque coloca na balança o bem-estar e a qualidade de vida dele.”

Fonte: G1, 05 de outubro de 2015.