Após um rombo recorde de R$ 10,4 bilhões registrado em 2013, o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), de onde saem os recursos para o pagamento do seguro-desemprego e do abono salarial dos brasileiros, precisará de aportes bilionários de recursos em 2014 e em 2015 para manter o "equilíbrio orçamentário". 

A avaliação consta em relatório sobre o fundo que está na proposta da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), enviada pelo governo ao Congresso Nacional na última semana, e é assinada pelo coordenador-Geral de Recursos do FAT, Paulo Cesar Bezerra de Souza, por Tito Calvo Jachelli, subsecretário de Planejamento, Orçamento e Administração-substituto,  e pelo secretário-Executivo do Conselho Deliberativo do FAT, Rodolfo Torelly.

Neste ano, segundo o relatório, a necessidade de aporte do Tesouro Nacional, para cobrir o resultado negativo, será de R$ 3,4 bilhões – além dos R$ 86,7 milhões que já constam na lei orçamentária de 2014. Em 2015, a situação será muito mais crítica. A previsão é que o FAT precisará de R$ 16,2 bilhões da União para fechar as contas e evitar um déficit.

As previsões de déficits consideram a "expectativa da continuidade da formalização de mão de obra, que aumenta o quantitativo de trabalhadores que acessam o seguro-desemprego e o abono salarial, bem como a avanço no aumento real do salário mínimo", diz o relatório.

Receitas 'retidas'
Segundo o presidente do Conselho Deliberativo do FAT, Quintino Severo, representante da Central Única dos Trabalhadores (CUT), o desequilíbrio nas contas do fundo acontece porque receitas do FAT estão "ficando retidas no governo federal".

"Grande parte [das retenções acontece] pela DRU [Desvinculação de Recursos da União] e outra parte pelas desonerações [do PIS/PASEP]. O Tesouro está ficando com os recursos do FAT", declarou ao G1. Em 2013, a DRU retirou R$ 13 bilhões do FAT.

Devolução de empréstimos
Severo afastou a possibilidade de que uma eventual ausência de aportes por parte do Tesouro Nacional afete o patrimônio do FAT – que somou R$ 209,7 bilhões no fim do ano passado.

Segundo ele, caso o Tesouro não coloque mais recursos no fundo, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) terá de devolver, ao FAT, empréstimos já feitos no passado. Pela Constituição Federal, parte das receitas do FAT deve ir para o BNDES financiar projetos de infraestrutura.

"No início deste ano, fizemos uma recomendação ao BNDES para que se preparasse para fazer devolução dos empréstimos. Voltamos a conversar no Conselho [Codefat] e dissemos que a Fazenda precisava se manifestar. Ele [BNDES] vai aguardar manifestação do Tesouro. Se o Tesouro não repuser, de algum lugar [o recurso] terá de vir. Mas isso ainda está indefinido. Não sei quando essa definição vai ser tomada, mas o governo tem que decidir", declarou Quintino Severo.

G1 entrou em contato com a Secretaria do Tesouro Nacional, mas, até a publicação desta reportagem, ainda não havia recebido resposta sobre o pedido.

Rombo pode ser maior em 2014
A necessidade de recursos, estimada para 2014 para fechar as contas e evitar déficit no FAT, pode ser maior ainda do que os R$ 3,4 bilhões que constam no relatório do governo, no projeto da LDO de 2015.

Isso porque a previsão de pagamento do seguro-desemprego que está no documento, para este ano, é de R$ 27,75 bilhões, contra R$ 31,9 bilhões pagos em 2013. Ao mesmo tempo, a estimativa que consta no relatório para o pagamento do abono salarial é de R$ 15,23 bilhões em 2014 – contra R$ 14,65 bilhões no ano passado.

Deste modo, o valor pago no seguro-desemprego, mais o abono salarial, em 2013, somou R$ 46,56 bilhões. A expectativa do governo para estes benefícios neste ano totaliza R$ 42,98 bilhões, ou seja, R$ 3,58 bilhões a menos do que em 2013 – apesar do aumento do salário mínimo, fator que que eleva os valores dos benefícios.

Segundo Quintino Severo,  presidente do Codefat, a previsão para o déficit do FAT neste ano é muito maior do que os R$ 3,4 bilhões estimados pelo governo, alcançando a marca de R$ 13 bilhões negativos. "O problema é que o orçamento [do FAT] subfaturou as despesas e superfaturou as receitas. Na equipe do Codefat, estamos sendo mais realistas. Achamos que a nossa projeção é correta. A gente fala em R$ 13 bilhões [de resultado negativo em 2014]", declarou.

Para 2015, o governo projeta R$ 38,5 bilhões para o seguro-desemprego e R$ 18,88 bilhões para o abono salarial – um valor total de R$ 57,38 bilhões destinados para o pagamento dos dois benefícios.

Contas em 2014 e 2015
Para 2014, o relatório do orçamento estima que o total de obrigações (pagamentos) do FAT será de R$ 61,73 bilhões, sendo R$ 18,17 bihões em empréstimos para o BNDES. Ao mesmo tempo, o total das receitas, para este ano, é estimado em R$ 58,31 bilhões, considerando R$ 86,7 milhões em aportes do Tesouro. Estão previstos R$ 45,44 bilhões do PIS/PASEP e outros R$ 11,67 bilhões de remunerações.

Em 2015, por sua vez, o total de obrigações do FAT deverá saltar para R$ 78,79 bilhões, dos quais R$ 19,65 bilhões irão para o BNDES. Ao mesmo tempo, o total das receitas, para o próximo ano, é projetado em R$ 62,56 bilhões – sem o aporte, apontado como necessário para manter o equilíbrio financeiro do FAT, de R$ 16,22 bilhões do Tesouro Nacional. Do valor total das receitas previstas para 2014, R$ 49,14 bilhões virão do PIS/PASEP e R$ 12,5 bilhões de remunerações.

Impacto na meta de superávit primário
Eventuais repasses do Tesouro Nacional para o Fundo de Amparo ao Trabalhador, conforme necessidade apontada pelos técnicos do governo – que está na proposta da LDO para 2015 – deverão, se realizados, dificultar o atingimento da meta de superávit primário neste ano e em 2015.

Para 2014, a meta de todo o setor público consolidado, incluindo governo, estados, municípios e empresas estatais, é de R$ 99 bilhões, o equivalente a 1,9% do PIB. Em 2015, o governo enviou, no projeto da LDO do ano que vem, uma meta de R$ 143,3 bilhões, ou 2,5% do PIB. Entretanto, também informou que o esforço poderá ser reduzido para, no mínimo, R$ 114,6 bilhões, ou 2% do PIB.

Fazenda preocupada com gastos
Os gastos com o seguro-desemprego e com o abono salarial estão na alça de mira do Ministério da Fazenda há algum tempo. Em outubro do ano passado, o ministro Guido Mantega chegou a dizer que, para diminuir os pagamentos dos valores relativos ao seguro-desemprego e abono salarial, que somaram R$ 48 bilhões no ano passado, estudava exigir um curso de qualificação para os trabalhadores já a partir do primeiro pedido feito.

Pelas regras atuais, a exigência de um curso de qualificação passou a valer a partir do segundo pedido do seguro-desemprego feito em dez anos. Antes do dia 11 de outubro deste ano, a reciclagem era obrigatória somente a partir do terceiro pedido de seguro-desemprego feito pelo trabalhador.

Essa proposta, entretanto, desagradou às centrais sindicais. Em dezembro de 2013, Mantega defendeu uma "proposta conjunta" com os sindicatos. "Já fizemos reuniões. Sairá quando estiver maduro. Não estou enfiando a faca no pescoço de ninguém", declarou Mantega na ocasião. Segundo ele, a proposta tem de considerar o intesse do trabalhador e, também, atentar para a questão da despesa pública.

Quintino Severo, representante da CUT e presidente do Codefat, diz que o problema não está nos valores pagos em seguro-desemprego e sim na retirada de recursos do FAT pelo Tesouro Nacional - via DRU e desonerações tributárias. "O problema do FAT não são as despesas. Elas estão dentro do número de pessoas, que ampliou muito. Em 2002, 22 milhões tinham direito ao seguro-desemprego. Passou para quase 50 milhões de pessoas. Com um público maior com direito, é natural que aumente o acesso [ao benefício]", opinou.

Fonte: G1, 23 de abril de 2014.