Se por um lado, não existem mais correntes ou senzalas, por outro, são inúmeras as semelhanças relatadas por trabalhadores de condições que remetem a uma escravidão contemporânea. 

Ameaças de morte, castigos físicos, dívidas que impedem o livre exercício do ir e vir, alojamentos sem rede de esgoto ou iluminação, sem armários ou camas, jornadas que ultrapassam 12 horas por dia, sem alimentação ou água potável, falta de equipamentos de proteção, promessas não cumpridas.

O Código Penal define uma pena de reclusão de dois a oito anos e multa para quem “reduz alguém a condição análoga à de escravo, quer submetendo-o a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a condições degradantes de trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto”.

Libertações

A cada dia, mais de 5 pessoas são libertadas, em média, no país. Dados do Ministério do Trabalho tabulados pelo G1 mostram que, nos últimos cinco anos, Minas Gerais lidera a lista de estados com resgates (2.000), seguido por Pará (1.808), Goiás (1.315), São Paulo (916) e Tocantins (913).

Os resgates ocorrem após denúncias feitas pelos trabalhadores. A Comissão Pastoral da Terra e os sindicatos e cooperativas são as principais entidades procuradas, já que há um receio do envolvimento de autoridades locais com os proprietários. Durante as blitzes, caso seja configurado o trabalho análogo à escravidão pelos auditores fiscais, as pessoas são libertadas e os empregadores são obrigados a pagar todos os direitos trabalhistas devidos.

Aliciamento

Uma das maiores dificuldades no país é combater o aliciamento dos trabalhadores. Um programa do Ministério do Trabalho batizado de Marco Zero foi criado para ajudar na intermediação dos trabalhadores e acabar com a figura do “gato”. 

Hoje, no entanto, ainda é comum a atuação desses contratadores ilegais, que agem em áreas de vulnerabilidade e acabam perpetuando a prática do trabalho escravo contemporâneo.

PEC do trabalho escravo

Enquanto ruralistas dizem que há exagero por parte dos fiscais e que muitas das infrações trabalhistas não configuram cerceamento de liberdade, entidades defendem uma punição exemplar quando houver flagrante desrespeito à dignidade do trabalhador, que, dizem, muitas vezes é tratado como um bem e não como um ser humano. A batalha também é travada no Congresso. Quinze anos após ser apresentada, a chamada PEC do Trabalho Escravo está prestes a passar pelas duas últimas votações.

A proposta de emenda à Constituição altera o artigo 243, determinando que as propriedades rurais e urbanas de qualquer região do país onde for flagrada a exploração de trabalho escravo sejam expropriadas e destinadas à reforma agrária e a programas de habitação popular, sem qualquer indenização ao proprietário e sem prejuízo de outras sanções previstas em lei. Além disso, prevê que todo e qualquer bem de valor econômico apreendido em decorrência dessa exploração seja confiscado e revertido a fundo especial.

Polêmica

Uma discussão sobre a definição de “trabalho escravo” é o cerne da questão. Enquanto alguns consideram a legislação clara, outros acreditam que ela dá margem à interpretação dos fiscais no momento da blitz. A regulamentação da medida deverá ser alvo de novos embates.

Fonte: Midia News, 14 de maio de 2014.