Oito em cada dez crianças e adolescentes que foram encontrados pela fiscalização trabalhando nos últimos dois anos e meio estavam em alguma ocupação perigosa ou insalubre, o que é proibido para menores de 18 anos. Além disso, a maior parte dos que trabalhavam, em qualquer atividade, tinha de 10 a 15 anos – o trabalho é totalmente proibido até 14 anos. Os dados compõem o relatório da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Trabalho Infantil, em fase de conclusão na Câmara dos Deputados.

Entre janeiro de 2011 e setembro de 2013, o Ministério do Trabalho (MTE) encontrou 12.813 crianças e adolescentes ocupados em todo o país, dos quais 10.568 em atividade de risco, como na produção de carvão vegetal, em matadouros, no transporte de cargas ou em camelôs em grandes centros urbanos. A lista inclui ainda crianças que trabalhavam em cemitérios, manguezais, na operação de máquinas pesadas, de corte e elétricas e em oficinas mecânicas, onde o contato com solventes pode ser fatal. Até 2020, o país se comprometeu a terminar com toda forma de trabalho infantil.

Abusos

Os registros da fiscalização do MTE trazem ainda informações sobre a exploração sexual de meninas e meninos. São mais de 200 expostos a abusos físicos, psicológicos e sexuais e que foram flagrados em prostíbulos, cabarés e bares. Mas os dados oficiais não levam em conta parcela que permanece invisível, formada por crianças arregimentadas pelo tráfico de drogas. E o serviço doméstico infantil, mais difícil de fiscalizar, tem baixo número de flagrantes: apenas 15 no período.

Pernambuco foi o estado com mais crianças ocupadas: 2.240, das quais 1.288 eram camelôs ou guias turísticos. O transporte de carga era feito por 790 pernambucanos de até 17 anos. No Amapá, 27 crianças flagradas trabalhando não tinham nem sequer cinco anos de idade. Em todo o Brasil, na faixa etária mais jovem (até quatro anos), foram 43 flagrantes. No Rio Grande do Norte, 12 crianças trabalhavam em cemitérios.

A secretária-executiva do Fórum Nacional de Erradicação do Trabalho Infantil, Isa de Oliveira, chama a atenção para a naturalização do trabalho infantil até mesmo em regiões prósperas. O Sul do país, que guarda a menor taxa de desemprego entre as principais regiões metropolitanas do Brasil (3,2%, em Porto Alegre) e exibe os menores índices de desigualdade, tem alta incidência de trabalho infantil. No Rio Grande do Sul, foram encontradas 1.029 crianças trabalhando, das quais 67 estavam expostas a substâncias cancerígenas como benzeno e arsênico.

No Paraná, em outro levantamento, do Ministério da Saúde, os acidentes graves envolvendo essa faixa etária chegaram a 911 nos últimos sete anos, com 23 mortes. “O trabalho infantil compromete a saúde e a escolaridade, expõe a criança a riscos. A formação dela tem que ocorrer na escola e na família”, diz Isa.

Fonte: Gazeta do Povo, 20 de maio de 2014.