Rodrigo Maia (DEM-RJ), codinome ''Botafogo'' na lista de pagamentos da Odebrecht, de acordo com delações de seus executivos, foi um dos responsáveis por retirar o resto do tapa-sexo que mantinha uma certa aura de pudor no Congresso Nacional no que diz respeito à proteção aos mais vulneráveis.

Caso a Câmara autorize a abertura de processo contra Temer, afastando-o por até 180 dias para seu julgamento pelo Supremo Tribunal Federal, quem assume não é o Aécio, mas o Botafogo.

Ele, que está à frente de uma das piores legislaturas da história da Câmara dos Deputados, capitaneou uma série de derrotas aos trabalhadores. Resgatando um projeto da era Fernando Henrique, conseguiu aprovar o projeto de lei da terceirização ampla – que deve precarizar a qualidade do emprego, colocar em risco a saúde e a segurança do trabalhador e tornar mais difícil processar os verdadeiros responsáveis pela exploração. Passou a PEC do Teto dos Gastos, limitando novos investimentos em áreas como educação e saúde públicas pelos próximos 20 anos – o que afetará quem depende do poder público para ver garantido um mínimo de dignidade, ou seja, os mais pobres.

E, claro, a Reforma Trabalhista. A partir de meia dúzia de propostas encaminhadas pelo Palácio do Planalto, ela ganhou corpo na Câmara dos Deputados com dezenas de mudanças. Grosso modo, o texto final foi inspirado por demandas apresentadas por confederações empresariais e por posições derrotadas em julgamentos no Tribunal Superior do Trabalho – posições que significaram perdas a empresários e ganhos a trabalhadores. Botafogo garantiu que ela fosse aprovada a toque de caixa sem que os parlamentares pudessem discutir o seu extenso conteúdo.

E, como cereja do bolo, Imagine que o possível próximo ocupante da Presidência da República afirmou que a ''Justiça do Trabalho não deveria nem existir''.

As leis e a justiça trabalhista, mesmo com suas imperfeições, têm sido responsáveis por garantir um mínimo de dignidade a milhões de brasileiros e a evitar que a lei da selva, ou seja, a sobrevivência do mais forte, prevaleça. Com o aprofundamento de uma crise econômica, os trabalhadores são os primeiros a sofrerem perdas substanciais. Deveriam ser os mais protegidos, portanto.

Mas vendo as ações tomadas por Rodrigo Maia e suas crenças, a sensação é de que o grande empresariado e o mercado financeiro é que são os vulneráveis diante da sanha de uma horda de trabalhadores insanos.

Pensando no governo Temer como um grande processo de desmonte do (já pequeno) Estado de bem- estar social, Rodrigo Maia será sua continuidade. Se ele já age como advogado empresarial sentado na cadeira da Presidência da Câmara dos Deputados, imagine o que fará no Palácio do Planalto. O mercado, essa entidade sem forma e sem rosto, que paira acima de tudo e de todos, professa a fé da imortalidade das reformas. Ou seja, se Temer voltar ao pó, elas reencarnarão no corpo de outra pessoa.

E não será Flamengo, Vasco ou Fluminense, mas Botafogo.

O problema é que, quem o conhece bem, sabe que ele deve ter dificuldade até para salvar a si mesmo quanto mais os outros políticos envolvidos nas denúncias da Lava Jato que ainda demandam aquele ''grande acordo nacional'' de salvação da velha política – acordo que foi uma das inspirações para o impeachment.

Temer recebeu duas tarefas do poder econômico: ''Combater a crise econômica jogando a fatura para longe do colo dos mais ricos'' e ''Aproveitar a crise para reduzir o Estado – não na parte que garante subsídios, desonerações e isenções de impostos sobre lucros e dividendos, o que beneficia aos ricos, mas reduzindo a parte que atende às necessidades da xepa humilde''. Rodrigo Maia tem sido peça fundamental nesse processo. Mas como escudeiro. O que é bem diferente de estar no foco das atenções.

Depois ainda perguntam de onde vem o desalento do brasileiro para protestar contra seu governo. Quando sai um, entra outro igual. Eleições diretas para a Presidência? Nem.

O Brasil sobrevive a um ''Botafogo'' no topo da tabela? Ninguém crava prognóstico. Mas sacanearam tanto com o campo de jogo, que é bem possível, ao final do campeonato, que a democracia demore muito, muito tempo para se recuperar.

O Congresso Nacional e a Confederação Brasileira de Futebol (CBF), e toda sua corrupção, não representam a maioria dos brasileiros. Mas atuam para te convencer que sim. Não surpreende, portanto, a quantidade de pessoas que veste a camisa da segunda para exigir moralidade à primeira.

Fonte: Blog do Sakamoto, 06 de julho de 2017.