Já pensou em trabalhar de graça? E recebendo um "valor simbólico" de R$ 50? Que tal um estágio com jornada diária de 10 horas? Parece trote, mas essas são vagas de emprego reais reunidas pela página Vagas Arrombadas (https://www.facebook.com/vagasVTNC/) no Facebook.
Criada há cerca de um mês pelo diretor de arte freelancer Tiago Perrart, 27, e pelo publicitário Daniel Alves, 31, a página já é seguida por mais de 60 mil pessoas. Por lá, eles divulgam anúncios de emprego que se destacam por salários muito abaixo do mínimo e jornadas acima do permitido pela legislação trabalhista, por exemplo, e requisitos inusitados como "comer alguma salada nas refeições diariamente (só tomate e milho não vale)" e "ouvir Anitta e Pabllo Vittar".
"Tivemos contato com vagas desse tipo enquanto buscávamos emprego e há tempos já íamos postando em nossos perfis pessoais", diz Perrart. "Então resolvemos reunir todas elas num mesmo lugar." A página no Facebook é alimentada com anúncios que eles mesmos encontram e por contribuições enviadas por internautas.
Sem benefícios
"O meu [anúncio] 'favorito' é o da empresa que alegava não disponibilizar benefícios, pois isso ia contra a cultura da empresa. Eles queriam formar empreendedores e, segundo eles, vale-transporte, vale-refeição etc. deixariam o colaborador acomodado", diz Perrart. No anúncio, a companhia faz questão de esclarecer que a política de não oferecer benefícios tem cunho ideológico, e não financeiro. "Algumas centenas de reais por pessoa não afetariam nosso orçamento".
Vaga com salário abaixo do mínimo
Outra situação comum encontrada pelos autores da página é a oferta de vagas com remuneração abaixo do salário mínimo nacional, de R$ 937, como um cargo de gerente administrativo em Florianópolis (SC) com salário de R$ 495. Mesmo quem investe na formação profissional não escapa dessas ofertas. Em um dos anúncios mostrados na página, uma empresa oferece uma vaga de analista administrativo em que é "desejável" que o candidato tenha MBA (uma pósgraduação voltada para negócios) em controladoria e finanças. ]
O salário? R$ 1.600. O cenário parece ainda pior para os estudantes. Pipocam anúncios de estágio não remunerado, com remuneração baixa ("R$ 180 e R$ 200 brutos", por exemplo) e com jornadas longas. "Uma moça queria contratar 16 estagiários de uma só vez e sem pagar ninguém", conta Perrart.
Pela legislação, o estágio tem caráter pedagógico, ou seja, é uma atividade educativa e deve estar relacionada ao curso frequentado pelo estudante. Quanto à carga horária, não pode passar de 6 horas diárias, totalizando no máximo 30 horas semanais. Ainda entre as empresas que desrespeitam a lei, há diversos albergues que oferecem vagas sem salário, em que o empregado troca moradia por trabalho. "O pior são as pessoas defendendo tais absurdos com alegações do tipo 'ah, na Europa é supernormal isso', diz Alves.
Pela lei brasileira, a troca de moradia por trabalho é um dos elementos que caracterizam a situação de trabalho análogo ao escravo. Expostas pela página, as empresas nem sempre reagem bem. "Teve o caso recente de um hostel (albergue) que estava chamando para briga, porrada mesmo, alguns leitores que foram comentar na página deles", dizem Perrart e Alves. Mas, segundo eles, algumas companhias entraram em contato pedindo dicas para melhorar os anúncios.
Fonte: UOL, 06 de setembro de 2017.