Se depender do presidente Michel Temer e seu ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, os 156 anos da Caixa Econômica Federal (CEF) como banco 100% público estão com os dias contados. Isso porque no cardápio amplo de privatizações, concessões e venda do patrimônio público do país, o governo Temer quer agora transformar a Caixa em sociedade anônima, com ações no mercado. Uma medida, diz o governo, com o objetivo de fazer o banco seguir "regras modernas de governança".
O argumento, entretanto, está longe de convencer o presidente da Federação Nacional das Associações de Pessoa da Caixa (Fenae), Jair Pedro Ferreira.
“Isso é uma falácia. A Caixa já segue regras de governança, o banco tem Conselho Fiscal, Conselho de Administração, Comitê de Auditoria... todas as regras de governança a Caixa tem. Para nós, usar esse argumento é disfarçar seu real interesse”, afirma Jair, sobre a preparação do terreno para a privatização do banco.
Na avaliação do dirigente, o enfraquecimento de uma instituição do porte da Caixa tem duas finalidades: uma, permitir que parte da fatia de mercado ocupada pelo banco público seja ocupado pelos privados; e duas, seguir na política de redução do Estado e abrir o capital e controle da Caixa para o mercado privado.
A Fenae, entidades sindicais bancárias de todo o país, parlamentares, centrais e movimentos sociais se articulam para alertar a sociedade sobre o impacto e as consequências da hipótese de privatização da Caixa .
“O banco público é um grande fomentador de desenvolvimento, em especial naquelas regiões do país onde bancos privados não vão”, destaca o presidente da Fenae, em entrevista na tarde desta terça-feira (7), no Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé, em São Paulo.
Atualmente, a Caixa é responsável por 70% de todo o financiamento imobiliário no Brasil, além de administrar políticas públicas importantes para a diminuição da desigualdade social, como o Bolsa Família, Minha Casa, Minha Vida e o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies), além de gerir o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), entre outras ações.
“Quem vai atender Fies? Quem vai entregar imóveis do Minha Casa, Minha Vida nos lugares mais remotos desse país? A Caixa Econômica Federal é importante para o Estado executar suas políticas e a sociedade não pode abrir mão dessa empresa”, explica Jair Ferreira. Para ele, a Caixa não pode ser pautada apenas pela rentabilidade, caso contrário, não tem condições de promover políticas que visam à redução da desigualdade.
“O mercado da rentabilidade só atende quem tem dinheiro, essa é a regra. Se tirarmos os bancos públicos, quem vai fazer financiamento de 30 anos para a população carente? Porque se não tem rentabilidade, banco privado não faz”, ponderou. “Eu não posso olhar política pública com esse viés, senão, qual sociedade vamos criar para as futuras gerações?”, questionou.
Mesmo atuando com forte papel social, o desempenho da Caixa tem se posicionado à altura do lucrativo sistema bancário nacional – a diferença é que os dividendos são integralmente da sociedade brasileira.
Momento de unir
Jair enfatizou a importância dos bancos públicos em outros países. Ele lembrou que na recente crise econômica mundial de 2008, as nações que têm bancos públicos sofreram menor impacto ou se recuperaram mais rapidamente da crise. “No processo anticíclico, esses bancos cumprem muito bem esse papel”, disse ele. Segundo o presidente da Fenae, em Alagoas, por exemplo, 96% dos empréstimos concedidos à população são feitos por meio de bancos públicos, enquanto no Ceará esse percentual é de 94%.
Objetivo do governo Temer ao querer transformar a Caixa em S/A é acabar com o papel do banco de principal financiador da casa própria no país, forçando a Caixa a “entrar na lógica geral dos bancos privados”, reitera.
Na prática, apenas cinco bancos concentram a maioria das operações do mercado brasileiro de varejo, dois públicos – Caixa e Banco do Brasil – e três privados – Itaú, Bradesco e Santander.
De acordo com o presidente da Fenae, para neutralizar a intenção do governo Temer é necessário um grande movimento de união das forças progressistas do país. Jair Ferreira destacou a importância das diversas frentes parlamentares em defesa de pautas específicas, mas disse acreditar que o momento é de “aglutinação” numa “grande frente de soberania popular”.
No fundo, diz, é tudo "desmonte" do Estado. “Tenho esperança que isso ganhe corpo nos próximos meses porque a sociedade precisa reagir. Se ficarmos só nas divisões, seremos derrotados mais rápido. Esse é o desafio.”
Fonte: RBA, 09 de novembro de 2017.