Estratégias da batalha contra a "reforma" da Previdência

 

Manobras do governo devem ser enfrentadas com mobilizações

 

O Jornal Correio Braziliense publica matéria informando que o governo conta com grupos que vão lutar pela aprovação das mudanças na Previdência Social, mas há também aqueles que entrarão em uma guerra para que o projeto saia muito diferente do que entrou no Congresso. O texto lembra que na última quarta-feira, em meio às diversas apresentações da “reforma” da Previdência, o chefe da Economia, Paulo Guedes, sentenciou para a rede estatal de televisão: “Naturalmente, existem 6, 7, 8 milhões de privilegiados, que estão sendo atingidos pela reforma. Têm mais força corporativa ou tiveram no passado, que dizem que (direitos) estão sendo ameaçados. Na verdade, os privilégios estão sob ameaça”. 

O ministro não deu nome aos bois, mas descreveu o lobby na forma mais crua. “(Eles) rondavam os parlamentos, ofereciam favores aos parlamentares.” É o já conhecido linguajar rude do ministro, de resto uma prática normal para quem não tem argumentos quando se trata de defender algo indefensável. O Correio Braziliense lembra que “menos de 24 horas depois das declarações de Guedes, os grupos de pressão contrários a mudanças nas regras de aposentadoria estão novamente prontos para a guerra, que terá como primeiro cenário o Congresso Nacional ao longo de pelo menos seis meses. “A partir de entrevistas com políticos, profissionais de relações governamentais e professores, o Correio montou um mosaico para revelar quais são as forças contrárias à proposta do governo”, diz a matéria.

Segundo o jornal, a dificuldade do Palácio do Planalto é o tamanho da “reforma” e a quantidade de trabalhadores atingidos pelas regras. A matéria cita que uma das categorias que começou a mobilização foi a dos integrantes da Polícia Federal, que votaram em peso no presidente Jair Bolsonaro. “A ação foi iniciada nas redes sociais ainda na quarta-feira, minutos depois da apresentação do texto. Policiais, em conversa reservada com o Correio, esperam um corpo a corpo no Congresso”, diz o texto. “É preciso jogar duro com um governo, que fez campanha com um slogan de investimentos em segurança e agora vira as costas para a categoria”, disse um delegado da PF, que preferiu não se identificar. 

Recesso da Câmara

No caso dos policiais, ficou estabelecida a idade mínima de 55 anos (para homens e mulheres) e o tempo mínimo de contribuição de 25 anos para mulheres (desde que tenham 15 anos de tempo de serviço) e 30 anos para homens (com mais de 20 anos de tempo de serviço). “Um temor dos governistas é de que o prazo de tramitação se prolongue até o fim do ano. Na última sexta-feira, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, disse que a Casa pode aprovar o projeto até julho, antes do recesso, caso passe pela Câmara até o mês de abril. É improvável, avalia o jornal. “O problema é que a premissa não parece verdadeira, pois a Câmara muito dificilmente concluirá a tramitação antes de julho”, disse Thiago Vidal, gerente de análise e política da Prospectiva.

O prazo trabalhado pela consultoria com base em propostas semelhantes é de que a discussão poderia se prolongar para depois do recesso na Câmara. “Mas é bom lembrar que os líderes devem trabalhar pelo encurtamento das 40 sessões que a comissão especial terá para deliberar sobre a matéria. Tudo a partir de acordo com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia”, afirmou Vidal, segundo o Correio. Mesmo assim, o prazo é julho.

De acordo como a matéria, o lobby mais eficiente, antes mesmo do início oficial da tramitação — começa na instalação da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), na próxima terça-feira —, foi feito pelos militares, que ficaram de fora da proposta apresentada por Guedes. O governo garantiu que, até 20 de março, envia um projeto específico para o pessoal da caserna. Mas isso terá de ocorrer antes, caso o Planalto queira que o texto ande mais rápido no Congresso. “Sem os militares, é melhor esquecer o texto original. Os deputados não têm como justificar, nas bases eleitorais, a não inclusão dos militares”, disse Vidal ao Correio.

A tramitação de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) é a mais complexa do Congresso, o que abre várias janelas de oportunidades para os insatisfeitos com o texto original do Planalto. Qualquer motivo pode se transformar na melhor desculpa para o deputado se recusar em votar a reforma da Previdência. Para efeito de comparação, a “reforma” do governo Lula, que previa três modificações na aposentadoria dos servidores, demorou quase nove meses de tramitação, lembra o jornal.

Comissão especial

A CCJ não debate o mérito do texto, apenas a admissibilidade. Na CCJ, a proposta passa por três avaliações: constitucionalidade, legalidade e técnica legislativa (normas e padrões) do texto. Parte dos embates está nessa comissão, a mais cobiçada pelos parlamentares do governo e da oposição. “Mesmo sem discutir o mérito, a atuação de grupos de pressão é iniciada”, disse ao Correio Luiz Alberto dos Santos, consultor legislativo do Senado e professor de políticas públicas da Fundação Getulio Vargas (FGV). Servidores de carreira típicas de Estado, policiais e trabalhadores da iniciativa privada e rurais devem buscar os deputados objetivando a preservação das atuais regras.

Segundo a matéria, a expectativa é a de que o lobby mais efetivo seja feito pelas associações de servidores com mais poder de fogo, como magistrados, procuradores, auditores, gestores governamentais e policiais federais. “Mas isso deverá levar outras categorias a buscarem interferir no texto, afinal, é um texto amplo, que deve receber várias emendas”, considerou Santos. Caso o texto seja aprovado na CCJ num prazo mínimo de cinco sessões, a Câmara é obrigada a criar comissão especial.

Na comissão especial, o jogo dos grupos de pressão se amplia, com a participação direta de setores empresariais, que tentarão preservar o texto original do Planalto ou mesmo melhorar as posições em contraponto ao lobby dos servidores, avalia o Correio. Nessa arena, há audiências públicas com interlocutores qualificados sugeridos pelos próprios lobistas. “Os mais fortes atores do lado do trabalhador estão nas associações de servidores de carreiras típicas, que vão buscar apoios nos gabinetes. Os sindicatos dos empregados da iniciativa privada perderam muito com a reforma trabalhista”, afirmou Antonio Augusto de Queiroz, diretor de documentação do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap).

Ele acredita que a reforma deve ser aprovada a partir da necessidade de mudança nas regras. “Antes isso não parecia tão claro para os políticos, agora, os governadores vão pressionar as bancadas estaduais.” É impossível prever quais os atores que mais devem avançar nas duas comissões. Na última etapa da tramitação, no plenário, a atuação dos lobistas permanece, mas com menor capacidade de atuação. Ali, o jogo é dominado pelas lideranças partidárias.

Vermelho