Bruno Garret de Almeida

Uma vez que as horas extras habitualmente prestadas computam o cálculo do DSR, fala-se em violação a disposição constitucional.

Conforme decidido pelo TST, em sede de Incidente de Recurso Repetitivo, a partir de 20/3/23, o valor majorado de Descanso Semanal Remunerado, decorrente da integração de horas extras habitualmente prestadas, passa a incidir sobre o cálculo das demais verbas trabalhistas, tais como férias, 13º salário, aviso prévio e FGTS. Tal entendimento, oriundo de confronto entre os conteúdos da súmula 19 do TRT da 5ª Região e da OJ 394 da SDI-1 do TST, altera a própria OJ em questão, que compreendia o assunto no sentido de considerar como indevida a incidência da majoração do DSR.

 

Para explicar a razão de tal mudança de entendimento, faz-se oportuno primeiro destacar quais são os requisitos para que uma parcela integre o cálculo de outra. Assim, nas palavras de Ricardo Resende1, é preciso que a parcela: a) tenha natureza salarial; b) seja concedida habitualmente; c) e não tenha sido projetada anteriormente no cálculo da parcela a integrar, sob pena de “bis in idem”. Nesse sentido, o que o TST entendia como impedimento à integração da majoração do DSR por horas extras prestadas habitualmente era especificamente a questão do “bis in idem”, posto que o entendimento consistia no raciocínio de que, ao considerar tal majoração, estar-se-ia contando a incidência das horas extras duas vezes para fins de cálculo das verbas trabalhistas.

 

Todavia, apesar dessa decisão do TST trazer essa mudança, a incidência da majoração do DSR já era tema que levantava discussões acadêmicas a respeito, bem como entendimentos judiciais contrários à própria OJ em questão, a exemplo da mencionada súmula 19 do TRT-5. Isto ocorria pois muitos argumentavam favoravelmente à tese de que não havia bis in idem, o que resulta de uma lógica aritmética, a qual serviu, inclusive, de base para a recente decisão do TST, cuja íntegra foi disponibilizada em 31/3/23.

 

Portanto, a fim de explicar tal raciocínio, faz-se oportuna a citação ao texto de Marcos Paulo Montanhani, intitulado “OJ 394 SDI-1: Comprovação matemática da inexistência do ‘bis in idem'”2, o qual indicamos a leitura, em que o autor sinaliza que, dentro das 220 horas mensais de um trabalho com jornada de trabalho de 44 horas semanais, inclui-se o tempo do DSR, simplificado para 44 horas.

 

Se, por outro lado, a incidência da majoração do DSR consistisse em “bis in idem”, ou seja, houvesse dupla incidência, teria que ser no caso de considerar as horas mensais no valor de 176, posto que, neste caso, as horas extras relativas à jornada de trabalho de 44 horas semanais seriam pagas como jornada de trabalho extraordinária, o que, somado à integração das horas extras ao DSR, resultaria em sua contagem em dobro.

 

Nesse sentido, observa-se que a recente decisão do TST a respeito da integração da majoração do DSR em razão de horas extras habitualmente prestadas foi correta, posto que a ausência de tal integração excluiria o DSR do complexo salarial, constituindo-se em erro crasso, conforme se pôde depreender pela lógica aritmética ora explicada.

 

Ademais, uma vez levado em conta tal raciocínio, percebe-se que a redação antiga da OJ em questão, na realidade, consistia em flagrante violação legal, porquanto, ao desconsiderar o DSR como parte do complexo salarial, reduz-se o valor devido a título de 13º salário, conforme se observa a partir de interpretação da súmula 172 do TST em conjunto com o art. 1º, §1º, da lei 4.090/1962, evidenciados pela decisão do C. TST e transcritos abaixo:

 

“Art. 1º – No mês de dezembro de cada ano, a todo empregado será paga, pelo empregador, uma gratificação salarial, independentemente da remuneração a que fizer jus.

 

§ 1º – A gratificação corresponderá a 1/12 avos da remuneração devida em dezembro, por mês de serviço, do ano

correspondente.”

 

“SÚMULA Nº 172 –  REPOUSO REMUNERADO. HORAS EXTRAS. CÁLCULO

 

Computam-se no cálculo do repouso remunerado as horas extras habitualmente prestadas.”

 

Assim, outra questão levantada na decisão é quanto à ofensa ao art. 7º, VIII, da CRFB/88, no qual é previsto que, para o cálculo do 13º salário, deve ser utilizado como base a remuneração integral do empregado. Logo, uma vez que as horas extras habitualmente prestadas computam o cálculo do DSR, fala-se em violação a disposição constitucional, como bem evidenciado no próprio acórdão recente do TST, o que apenas confirma a necessária alteração da redação antiga da OJ 394 da SDI-1 do TST.

______________

1 RESENDE, Ricardo. Direito do Trabalho. Rio de Janeiro: Grupo GEN, 2020.

2 Disponível em https://www.migalhas.com.br/depeso/357475/oj-394-sdi-1-comprovacao-matematica-da-inexistencia-do-bis-in-idem