O que o incomoda mais no ambiente de trabalho? Uma consultoria de mobilidade de talentos norte-americana, Lee Hecht Harrison, fez essa pergunta a 848 profissionais nos Estados Unidos no último mês de abril e 45% deles responderam que o colega tagarela é o principal motivo de distração e interrupção nos escritórios. A seguir, com percentual bem abaixo, vieram queixas às trocas de e-mails (citadas por 18% dos entrevistados) e, acredite, sobre os odores dos próprios colegas, com 9% .

Ao avaliar a pesquisa, o vice-presidente da consultoria, Jim Greenaway, disse que "profissionais tagarelas em geral não fazem ideia de quão irritantes são para seus colegas". Segundo ele, as distrações e interrupções no ambiente corporativo ocorrem quando os tagarelas perdem a capacidade de discernimento, não compreendem os limites e não percebem que os colegas estão dando sinais de que se incomodam com a conversa fora de hora. 

O presidente da Sociedade Latino-Americana de Coaching, Sulivan França, diz não se surpreender com o resultado do estudo norte-americano. "Provavelmente teríamos a mesma avaliação se uma pesquisa semelhante fosse realizada no Brasil", afirma. Só que ele relativiza o suposto comportamento inadequado do profissional dito conversador. Para França, cabe aos recrutadores saber encaixar esse colaborador num setor em que sua verve comunicativa ou necessidade de trocar ideias com os colegas seja utilizada a favor da empresa. "Quando se fala de pessoas que conversam muito no mercado corporativo, tem a ver com o perfil do profissional. E aí tem que haver um cuidado no processo seletivo. Um profissional que tem um perfil extremamente comunicativo pode ser ideal, dependendo da área que se busca. Se cercear esse comportamento, a empresa corre o risco de inibir o potencial produtivo desse profissional", esclarece. 

O coach salienta que há ferramentas no processo seletivo que devem ser utilizadas para identificar o perfil apropriado de um colaborador para a área mais adequada. "Temos a ferramenta DISC, que traduzindo para o português identifica quatro perfis do profissional no processo seletivo: dominação, influência, estabilidade e cautela. Uma pessoa com predominância I é influente, comunicativa, e o grande cuidado que precisa ter é aliar esse potencial com a competência. Se alocar esse profissional I num setor de vendas ou numa área onde há pessoas da mesma ‘tribo’, ele vai deslanchar. Agora, se alocá-lo num setor com predominância de profissionais D e C, que são mais centrados e precisam de concentração para desenvolver seu trabalho, o grau de insatisfação dos colegas com esse sujeito vai passar de 45% para 90%", exemplifica. 



CONVERSA PARALELA
A recepcionista Letícia Viviane Silva Peixoto já trabalhou como vendedora em revendas de aparelhos de telefone celular e conta que soube explorar bem seu lado comunicativo nessa função. "Para um vendedor, quanto mais falar com as pessoas melhor é para atrair os clientes. É preciso ser comunicativo", afirma. Mas na função que ela exerce atualmente numa indústria de alumínios, a conversa tem que ser comedida. "A conversa paralela atrapalha bastante, principalmente quando são assuntos indevidos. Aqui eu monitoro a entrada e saída de pessoas, atendo aos telefonemas, auxilio em algumas tarefas administrativas, se eu ficar de conversa não dá pra dar atenção total ao meu trabalho", conta. Antes de assumir a recepção, a funcionária trabalhou por um ano no setor de produção da empresa, onde o número de colaboradores é maior, e o contato com os colegas, mais próximo. "Foi difícil eu me adaptar no começo, porque gosto de falar, mas já estou adaptada", revela. 

No departamento financeiro da mesma empresa, até a "chefe" tem que se policiar. "Acho que se eu trabalhasse na produção seria demitida por justa causa por causa de conversa", brinca a diretora financeira Jamile El Janene. Mas ela garante que as conversas não atrapalham o rendimento de sua equipe, formada por dois colaboradores. Um deles é a própria tia, Neusa Vieira, outra tagarela confessa. "Eu acho que sou a que mais conversa aqui. Acaba sendo um momento de descontração. Se ficar todo mundo numa sala fechada trabalhando o tempo todo, estressa. Claro que tem que saber a hora de parar, tem dia que a gente nem tem tempo de ficar conversando", conta, com a anuência da sobrinha.

Fonte: Folha de Londrina, 11 de agosto de 2014.